Publicado originalmente no jornal O Popular (clique aqui).

Tenho a honra de carregar o nome da minha mãe, somado ao sobrenome do meu pai. Considero isso um presente que recebi desde o meu nascimento, pois trago comigo suas histórias, legados e o amor que eles tiveram por mim em vida. Compartilhar o nome com alguém é um gesto significativo e uma parte fundamental da organização da nossa sociedade.

No filme “Me chame pelo seu nome”, de 2017, amantes combinam de se chamarem um pelo nome do outro, compartilhando assim aquilo que tinham de mais precioso. Uma delicadeza sem fim, esta película que ganhou o Oscar no ano seguinte.

Desde a Idade Média, várias sociedades ocidentais adotaram sobrenomes familiares, e esse costume continua até hoje, quando os filhos, ao nascerem ou serem adotados, recebem os sobrenomes dos pais. Embora seja algo previsto em lei, não deixa de ser um gesto bonito e cheio de significado.

O nome é frequentemente considerado um dos primeiros marcos na formação da identidade de uma pessoa. Ele é atribuído desde o nascimento e é uma das maneiras pelas quais uma pessoa começa a ser reconhecida e identificada pelos outros. Mas, e se esse nome não fizer sentido na construção da sua individualidade? A possibilidade legal de mudar o próprio nome representa um avanço significativo no reconhecimento da importância da identidade pessoal.

A Lei Federal nº 14.382/22, que introduziu a possibilidade de mudança de nome diretamente em Cartório, representa um marco na busca pela dignidade e respeito às identidades individuais. Em um ano, a norma trouxe várias alterações na Lei de Registros Públicos, ampliando as opções para a alteração de nomes e sobrenomes sem a necessidade de procedimentos judiciais. Até julho deste ano, 342 pessoas mudaram de nome em Goiás após a nova lei.

A importância legal dessa conquista reside na compreensão de que cada pessoa tem o direito de escolher como deseja ser chamada, de acordo com sua identidade de gênero, convicções pessoais ou simplesmente porque não se identifica com o nome de nascimento. A dignidade está intrinsecamente ligada à possibilidade de se reconhecer e ser reconhecido pelo próprio nome, sem que este seja uma imposição externa.

Num mundo diverso e em constante evolução, a flexibilidade na escolha do próprio nome é um reflexo de uma sociedade que valoriza a individualidade e o respeito à autonomia das pessoas. Na minha família, temos mais uma Maria Luiza, minha neta, nome que recebeu de seus pais e que espero que faça sentido em sua vida adulta. Procuro honrar o nome que me foi dado pelos meus pais e fazer com que a pequena Maria Luiza sinta orgulho do seu nome de batismo. No entanto, é reconfortante saber que ela e qualquer outra pessoa tem a liberdade de escolher quais heranças desejam levar ao longo de suas vidas. A dignidade de escolher o próprio nome é um direito fundamental que merece ser celebrado e protegido.

Maria Luiza Póvoa Cruz é juíza aposentada e advogada de Família.