Publicado originalmente no jornal O Popular (clique aqui).
No cenário contemporâneo, a responsabilidade parental enfrenta novos desafios com a onipresença da tecnologia digital na vida das crianças. Como avó, me vejo diante de um mundo novo e com preocupações que não tive como mãe. Mas hoje é imperativo refletir sobre o papel dos pais e educadores na mediação do uso de dispositivos eletrônicos por crianças menores de idade.
Recentemente, uma decisão inovadora no Rio de Janeiro ganhou destaque na mídia ao proibir o uso de celulares por crianças menores de 12 anos nas escolas municipais, durante todo o horário escolar, incluindo recreios e intervalos entre as aulas. Essa medida, embasada no Relatório de Monitoramento
Global da Educação 2023 da Unesco, destaca os impactos negativos do uso irrestrito dos aparelhos celulares na aprendizagem, concentração e saúde das crianças.
O Brasil, sendo um dos países que mais utiliza redes sociais no mundo, enfrenta um dilema único. Como proteger a privacidade e o bem-estar de crianças e adolescentes em um ambiente digital tão vasto e dinâmico? O Estatuto da Criança e do Adolescente, de 1990, garante direitos como privacidade e proteção da imagem, mas como aplicar esses princípios quando oferecemos ferramentas que podem expô-los prematuramente?
A intoxicação digital infantil é uma realidade cada vez mais presente. Dados da pesquisa Tic Kids Online Brasil 2019 indicam que, naquele ano, 89% da população entre 9 e 17 anos era usuária de internet, sendo 95% destes utilizando o telefone celular como principal dispositivo de acesso. A magia do brincar ao ar livre, como também viveu a minha geração e a dos meus filhos, e o contato com outras crianças têm sido prejudicados, enquanto a exposição digital aumenta.
Como advogada de família, destaco a importância da responsabilidade parental nesse contexto, mas também a importância de que se criem instrumentos legais para proteger nossas crianças. Em análise no Senado Federal, o PL 2.628/2022, de autoria do senador Alessandro Vieira e relatoria do senador Jorge Kajuru, propõe medidas cruciais para garantir a segurança on-line dos jovens no Brasil. O texto busca proibir a criação de contas em redes sociais por menores de 12 anos, estabelecendo regras específicas e mais protetivas para essa faixa etária. Além disso, aborda a necessidade de conscientização e educação para o consumo na era digital.
É claro que a lei deverá ser sempre somada à supervisão e orientação dos pais em relação ao uso seguro e responsável das plataformas de mídia social. Estabelecer limites saudáveis para o tempo de tela, monitorar o conteúdo acessado e manter uma comunicação aberta são práticas fundamentais e garantem segurança para os filhos.
A responsabilidade parental em tempos digitais não é estática e requer adaptação contínua às mudanças tecnológicas. Ao educar e apoiar as crianças para o novo tempo que vivemos, estabelecer regras torna-se fundamental.
Em resumo, a reflexão sobre o papel dos pais na era digital é urgente. A decisão no Rio de Janeiro é um exemplo de como as autoridades estão buscando proteger as crianças diante dos desafios digitais.
Instigo a sociedade a discutir e adotar medidas concretas para enfrentar esse problema, garantindo o desenvolvimento saudável das futuras gerações.
Maria Luiza Póvoa Cruz, advogada especializada em Direito de Família, presidente da Comissão Nacional de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa do Ibdfam.