Publicado originalmente no portal do Ibdfam (clique aqui).

Celebrados anualmente em 1º de outubro, o Dia Nacional da Pessoa Idosa e o Dia Internacional da Terceira Idade são uma oportunidade para discutir sobre o papel das famílias no cuidado e na proteção dos direitos dos idosos, bem como de assegurar a proteção jurídica dessa população vulnerável.

“O Brasil alcançou uma importante vitória ao aumentar a longevidade de sua população. Hoje, a expectativa de vida média é de mais de 75 anos. No entanto, viver mais também traz novos desafios”, aponta a advogada Maria Luiza Póvoa Cruz, presidente da Comissão Nacional da Pessoa Idosa do IBDFAM.

Para a especialista, é necessário garantir não apenas o aumento da expectativa de vida, mas também o direito a uma velhice digna e respeitosa. “Um dos caminhos para isso é a implementação de uma forte campanha de conscientização.”

“O envelhecimento faz parte do ciclo de vida e os idosos devem ser vistos como protagonistas, com autonomia, participação ativa na sociedade e respeito aos seus direitos, tanto físicos quanto emocionais e patrimoniais”, observa.

A especialista defende que a promoção de uma cultura de valorização à pessoa idosa é essencial para a construção de uma sociedade que cuide e respeite seus membros mais velhos. “Além dos avanços legislativos, é essencial reforçar políticas públicas para a promoção de autonomia, bem-estar e inclusão social.”

Estatuto do Idoso

Maria Luiza Póvoa Cruz reconhece os avanços conquistados na seara, como o Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003) e a decisão do Supremo Tribunal Federal – STF que permitiu a escolha do regime de bens para pessoas acima de 70 anos (na qual a advogada proferiu sustentação oral). “Esta conquista tem a participação ativa do IBDFAM e é um grande avanço na garantia de autodeterminação dos idosos.”

“O Estatuto do Idoso, em mais de duas décadas de vigência, trouxe dignidade e avanços significativos para as pessoas idosas no Brasil. A lei representou um marco importante, assegurando direitos fundamentais e trazendo mais proteção para essa população”, observa.

A advogada observa que o Brasil avançou consideravelmente na proteção dos mais velhos, e a velhice deixou de ser vista como uma doença. Contudo, pondera: “Ainda não atingimos as oportunidades esperadas, especialmente em um país que está envelhecendo rapidamente”.

“Ainda são necessários avanços legislativos para fortalecer a proteção aos idosos, especialmente em relação à violência física, psicológica e patrimonial. Precisamos de legislações mais robustas para combater a violência patrimonial, que muitas vezes acontece dentro do núcleo familiar e é de difícil detecção”, comenta.

No entendimento dela, mecanismos mais eficazes de denúncia, fiscalização e responsabilização são essenciais. “Precisamos avançar ainda mais em políticas que protejam sua autonomia e dignidade dos idosos.”

“Parte das determinações legais ainda é desobedecida, especialmente com relação à aplicação prática dos direitos à saúde, convivência familiar e combate ao abandono. A fiscalização e a efetividade de políticas públicas precisam ser fortalecidas para garantir esses direitos na sua totalidade”, complementa.

Convivência familiar

Com base em dados do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, divulgados em junho de 2023, Maria Luiza Póvoa afirma que, embora a legislação brasileira garanta o direito dos idosos à convivência familiar, o grande desafio é a falta de cumprimento desse direito na prática.

Conforme o levantamento, as denúncias de abandono de idosos aumentaram 855% entre janeiro e maio em comparação ao mesmo período de 2022. Foram quase 20 mil registros em cinco meses, contra 2.092 casos no ano anterior. “Infelizmente, muitos idosos enfrentam abandono e isolamento social, mesmo com a previsão legal.”

“Isso demonstra que, apesar dos avanços legais, ainda há um abismo entre a previsão legislativa e a realidade enfrentada por muitos idosos no Brasil. O desafio, além de fiscalizar e punir o abandono, é criar políticas públicas que promovam o vínculo familiar e social dos idosos, fortalecendo o papel das famílias e da sociedade na garantia de uma velhice digna e ativa”, avalia.

De acordo com a especialista, os principais desafios para manter vínculos afetivos e sociais estão relacionados ao distanciamento físico e à negligência emocional. “Embora a legislação assegure o direito à convivência, ela não consegue impor afeto ou presença familiar.”

“Muitos idosos, especialmente os que vivem sozinhos, sofrem com a solidão e o isolamento social. A sociedade precisa fomentar uma cultura de cuidado e valorização da presença dos idosos, além de fortalecer redes de apoio”, destaca.

Outro desafio é o combate aos abusos financeiros, especialmente dentro do núcleo familiar. “É fundamental criar campanhas de conscientização e mecanismos de denúncia anônima para proteger o idoso de possíveis retaliações.”

“Além disso, o acompanhamento de instituições públicas, como o Ministério Público e a Defensoria Pública, deve ser fortalecido para garantir a proteção patrimonial dos idosos”, acrescenta a especialista.

Responsabilidade

Por fim, a advogada ressalta a importância do núcleo familiar para a promoção da autonomia e dignidade dos idosos. “As famílias desempenham um papel crucial, principalmente ao proporcionar suporte emocional, além do material.”

O Direito, segundo Maria Luiza, pode assegurar essa responsabilidade com a criação de incentivos e com a imposição de sanções nos casos de abandono afetivo e material.

“A legislação deve não apenas proteger o idoso, mas também incentivar que a família se comprometa com seu bem-estar, respeitando sua autonomia”, conclui.